Que horas são?

sábado, 12 de janeiro de 2013

                                    (aprendendo a reconhecer os sinais da Vida...)



"Há coisas que ocorrem em nossa vida,que são o próprio ponto final travestido de ato. Só nos resta reconhecer."


                      [Helena Britto Pereira]




E eu que coleciono lápis, caixinhas, latinhas e bonecas, só uso as roupas que gosto, colho flores dos jardins alheios (e elas crescem, lindamente em meu jardim), como pão no caminho de volta da padaria, choro em qualquer lugar e rio das coisas mais ridículas.   Eu estou começando a envelhecer. Ainda bem!! Difícil é quando negamos a passagem do Tempo     e vivemos fugindo dos espelhos. Fuja, não!! Compre um espelho lindo para ver o Tempo. Ele é você em movimento.



"Quando eu for velha, vou me vestir de roxo
Com um chapéu vermelho que não combina, e não me deixa bem.
Quero gastar minha aposentadoria em conhaque, luvas de seda e sandálias de cetim,
e dizer que não tenho o dinheiro da manteiga.
Vou sentar-me na calçada quando estiver cansada,
e comer todas as promoções dos supermercados,
Tocar as campainhas dos vizinhos, arrastar meu guarda-chuva nos gradis das ruas.
Para compensar a sobriedade da minha juventude.
Sairei de chinelos na chuva, colherei flores em jardins alheios, e aprenderei a cuspir no chão.
Vou usar roupas horríveis, engordar sem culpa, e comer três quilos de salsichas de uma só vez,
ou apenas pão e picles por uma semana
Vou colecionar caixinhas, lápis e rótulos de cerveja.
Mas por ora, devemos ter roupas que nos mantenham secas
Pagar nosso aluguel e não dizer palavrão pelas ruas,
e dar bom exemplo para as crianças.
Devemos ter amigos para jantar e ler os jornais.
Mas talvez eu devesse praticar um pouco agora?
Para que quem me conhece não fique muito chocado ou surpreso
Quando eu for velha e passar a usar roxo."



[Jenny Joseph]


                                                        (o valor de uma página em branco...)





PLANO



"Trabalho o poema sobre uma hipótese: o amor
que se despeja no copo da vida, até meio, como se
o pudéssemos beber de um trago. No fundo,
como o vinho turvo, deixa um gosto amargo na
boca. Pergunto onde está a transparência do
vidro, a pureza do líquido inicial, a energia
de quem procura esvaziar a garrafa; e a resposta
são estes cacos que nos cortam as mãos, a mesa
da alma suja de restos, palavras espalhadas
num cansaço de sentidos. Volto, então, à primeira
hipótese. O amor. Mas sem o gastar de uma vez,
esperando que o tempo encha o copo até cima,
para que o possa erguer à luz do teu corpo
e veja, através dele, o teu rosto inteiro."


(Nuno Júdice)









ATENÇÃO AO SÁBADO




[Clarice Lispector]




"Acho que sábado é a rosa da semana; sábado de tarde a casa é feita de cortinas ao vento, e alguém despeja um balde de água no terraço; sábado ao vento é a rosa da semana; sábado de manhã, a abelha no quintal, e o vento: uma picada, o rosto inchado, sangue e mel, aguilhão em mim perdido: outras abelhas farejarão e no outro sábado de manhã vou ver se o quintal vai estar cheio de abelhas.



No sábado é que as formigas subiam pela pedra.

Foi num sábado que vi um homem sentado na sombra da calçada comendo de uma cuia de carne-seca e pirão; nós já tínhamos tomado banho.

De tarde a campainha inaugurava ao vento a matinê de cinema: ao vento sábado era a rosa de nossa semana.

Se chovia só eu sabia que era sábado; uma rosa molhada, não é?

No Rio de Janeiro, quando se pensa que a semana vai morrer, com grande esforço metálico a semana se abre em rosa: o carro freia de súbito e, antes do vento espantado poder recomeçar, vejo que é sábado de tarde.

Tem sido sábado, mas já não me perguntam mais.

Mas já peguei as minhas coisas e fui para domingo de manhã. 

Domingo de manhã também é a rosa da semana. 

Não é propriamente rosa que eu quero dizer."




[Texto extraído do livro "Para não Esquecer", Editora Siciliano - São Paulo, 1992.]



sexta-feira, 11 de janeiro de 2013










A poesia de Fernando Couto...




DE SÚBITO



"De súbito,
a tristeza nasce no teu rosto,
suave, densa e silenciosa
– céu da África ainda sem noite nem dia

A lua,
tua irmã africana,
irrompeu dos teus ombros,
esplendorosa e suave.

E ao gesto diáfano das tuas mãos
incendiou-se a noite."



[Fernando Couto]








VERÃO  AFRICANO


"A plácida cor deste hálito envolvente,
a tangível paz de calor e da savana,
o céu enfeitiçado de azul sem mácula,
a modorra só quebrada pelo canto
e o mar - um velho cão adormecido."



[Fernando Couto]








CUANDO LLEGUÉ A LA VIDA


[Alfonsina Storni]


"Vela sobre mi, mi grave amor inmenso:
Cuando llegué a la vida yo traía en suspenso,
En el alma y la carne, la locura enemiga
El capricho elegante y el deseo que hostiga.

Me encantaban los viajes por las almas humanas,
La luz, los etranjeros, las abeja livianas,
El ocio, las palabras que unucuan el idilio
Los cuerpos armoniosos, los versos de Virgilio.

Cuando sobre tu pecho mi alma fue apaciguada,
Y la dulce criatura, tuya y mía, deseada,
Yo puse entre tus maos toda mi fantasía

Y te dije humillada por estos pensamientos:
-iVigílame los ojos! Cuando cambian los vientos
El alma femenina se trastorna y varía…"


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QUANDO  CHEGUEI  À  VIDA


[Alfonsina Storni - 
Tradução de Héctor Zanetti]



"Vela sobre minha vida, meu grande amor imenso.
Quando cheguei à vida trazia em suspense,
na alma e na carne, a loucura inimiga,
o capricho elegante e o desejo que açoita.

Encantavam-me as viagens pelas almas humanas,
a luz, os estrangeiros, as abelhas leves,
o ócio, as palavras que iniciam o idílio,
os corpos harmoniosos, os versos de Virgílio.

Quando sobre teu peito minha alma foi tranquilizada,
e a doce criatura, tua e minha, desejada,
eu pus entre tuas mãos toda minha fantasia

e te disse humilhada por estes pensamentos:
-Vigiai-me os olhos! Quando mudam os ventos
a alma feminina se transtorna e varia…"




quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

~ despedaçado chega ao fim da vida
 quem jamais se arrebentou de amor ~        

                               Alessandra Siedschlag








Se for por amor e em amor, a Vida vale cada segundo do Tempo que nos é dado. Se não, apenas vivemos, cumprindo os dias.
E só viver é muito, muito pouco.Por isto, permita-se caminhar nos precipícios, desbrave  seus caminhos mais desconhecidos, encare seus fantasmas, alie-se às dúvidas, não alimente silêncios  Não sinta medo das feridas profundas, as cicatrizes são tatuagens da nossa própria história. Seja espelho de si mesmo e questione-se:"É por amor?" Se for, siga em frente.

Corajosamente ,vá!





PROPOSTA  DI  MODIFICA


(Erri de Luca)
Tradução de Alessandra Siedschlag


"Se existe o verbo desnaturar, deveria existir também enaturar,
com o qual substituo o verbo enamorar.
porque acontece assim: reavivo o corpo,
uma música me comove, uma corrente elétrica viaja sob
as pontas dos meus dedos,
um cheiro me provoca uma lágrima, suo, enrubesço,
ali no osso sacro se agita uma cauda que se
perdeu.
Eu me enaturei: é mais leal.
Me enaturo de ti quando te abraço."



"C’è il verbo snaturare, ci dev’essere pure innaturare,
con cui sostituisco il verbo innamorare
perché succede questo: che risento il corpo,
mi commuove una musica, passa corrente sotto
i polpastrelli,
un odore mi pizzica una lacrima, sudo, arrossisco,
in fondo all’osso sacro scodinzola una coda che s’è
persa.
Mi sono innaturato: è piú leale."
M’innaturo di te quando t’abbraccio."




quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

100 ANOS DO ESCRITOR RUBEM BRAGA


RUBEM BRAGA  (12 de janeiro de 1913 -  19 de dezembro de 1990)










DESPEDIDA é um texto impecável do Rubem Braga sobre a maneira torta de dizer adeus. Não ousaria discordar, mas prefiro as palavras. O silêncio deixa entrelinhas que nunca serão lidas como foram escritas.
Rubem escreveu este texto em 1967, mesmo ano em que nasci, um período em que a carta trazia as boas e as más notícias. Mais de quatro décadas depois, eu falo, você ouve, nós nos comunicamos. Em segundos, pode-se iniciar ou terminar uma relacionamento. Esgote todos os recursos, do sinal de fumaça ao email, do código morse ao telefone celular, mas não use o silêncio. Ele não diz nada, apenas pergunta.
E leia Rubem Braga vez ou outra, as palavras dele são maceradas na experiência e no talento para viver.



DESPEDIDA





"E no meio dessa confusão alguém partiu sem se despedir; foi triste. Se houvesse uma despedida talvez fosse mais triste, talvez tenha sido melhor assim, uma separação como às vezes acontece em um baile de carnaval — uma pessoa se perda da outra, procura-a por um instante e depois adere a qualquer cordão. É melhor para os amantes pensar que a última vez que se encontraram se amaram muito — depois apenas aconteceu que não se encontraram mais. Eles não se despediram, a vida é que os despediu, cada um para seu lado — sem glória nem humilhação.




Creio que será permitido guardar uma leve tristeza, e também uma lembrança boa; que não será proibido confessar que às vezes se tem saudades; nem será odioso dizer que a separação ao mesmo tempo nos traz um inexplicável sentimento de alívio, e de sossego; e um indefinível remorso; e um recôndito despeito.




E que houve momentos perfeitos que passaram, mas não se perderam, porque ficaram em nossa vida; que a lembrança deles nos faz sentir maior a nossa solidão; mas que essa solidão ficou menos infeliz: que importa que uma estrela já esteja morta se ela ainda brilha no fundo de nossa noite e de nosso confuso sonho?




Talvez não mereçamos imaginar que haverá outros verões; se eles vierem, nós os receberemos obedientes como as cigarras e as paineiras — com flores e cantos. O inverno — te lembras — nos maltratou; não havia flores, não havia mar, e fomos sacudidos de um lado para outro como dois bonecos na mão de um titeriteiro inábil. 




Ah, talvez valesse a pena dizer que houve um telefonema que não pôde haver; entretanto, é possível que não adiantasse nada. Para que explicações? Esqueçamos as pequenas coisas mortificantes; o silêncio torna tudo menos penoso; lembremos apenas as coisas douradas e digamos apenas a pequena palavra: adeus. 



A pequena palavra que se alonga como um canto de cigarra perdido numa tarde de domingo."







Rubem Braga, do livro "A Traição das Elegantes", Editora Sabiá – Rio de Janeiro, 1967, pág. 83.





segunda-feira, 7 de janeiro de 2013





"O que as pessoas mais desejam é alguém que as escute de maneira calma e tranquila. Em silêncio. Sem dar conselhos. Sem que digam: "Se eu fosse você". A gente ama não é a pessoa que fala bonito. É a pessoa que escuta bonito. A fala só é bonita quando ela nasce de uma longa e silenciosa escuta. É na escuta que o amor começa. E é na não-escuta que ele termina. Não aprendi isso nos livros. Aprendi prestando atenção."


In: O AMOR QUE ACENDE A LUA)
Rubem Alves




                          (a sombra é tão-só o outro lado da luz...)



Das vezes que a Lua esteve em escorpião, meu signo solar, no ano de 2012. Pela poesia da Amanda Costa:


[Dropsastrais–Lua em Escorpião:  16/1/2012]

"vórtice e voragem
mergulho espiral
vertiginoso voo
subaquático
subterrâneo
ultrasônico
parabólico 
bólido 
a bulir 
o silêncio profundo da emoção."




[Dropsastrais-Lua em escorpião: 14/02/2012]


"águas em revolvência
emoções
funduras
intensidades
iluminações
borbulhante no caldeirão fervente
a prima materia da criação."


Visite o site da Amanda Costa